sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Pobre

Aos meus versos não dou preço,
Que os faço por desfastio.
Mas só com eles me aqueço.
      Tenho frio!
Por desfastio, brincando,
Quem me quiser que me tome.
É assim me vou sustentando.
      Tenho fome!
Brincando os deixo — gotinhas
Na secura da parede.
Não há fontes mais vizinhas...
      Tenho sede! tenho sede!

Autor: José Régio (1901-1969)
Poeta português, do livro Música Ligeira
(Portugália Editora)

quarta-feira, 26 de outubro de 2011


"A Pele Que Habito" estreia e devolve Almodóvar aos cinemas

Exibido no Festival do Rio, filme acumula críticas positivas
divulgação
Foto
Filme foi exibido no Festival de Cinema do Rio de Janeiro
Se considerarmos o bom desempenho da última obra de Woody Allen, “Meia Noite em Paris”, no Brasil, não é tão surpreendente a expectativa observada por aqui em relação ao novo filme de Pedro Almodóvar, cuja estreia está confirmada para 14 de outubro.
O público brasileiro tem demonstrado sinais de amadurecimento na hora de escolher a diversão do fim de semana. Os blockbusters continuam no topo, mas os grandes diretores conseguem se aproximar das primeiras posições do ranking.
“A Pele Que Habito” certamente terá uma resposta significativa em seu primeiro final de semana no circuito. Almodóvar é tão cultuado quanto Allen, e sua identificação com o Brasil, seja nas trilhas sonoras, na amizade com Caetano Veloso ou nas declarações simpáticas de sempre, é outro fator a favor do cineasta.

Lançado oficialmente no Festival do Rio, o filme traz Antonio Banderas no papel principal. Banderas interpreta o cirurgião plástico Richard Legrand, que após perder a esposa em um acidente automobilístico inicia pesquisas para obter a pele perfeita, a estrutura que teria impedido a perda de sua companheira.
A trama “futurista”, jocosamente vivenciada em 2012, apresenta, a partir do drama de Legrand os vícios modernos e clássicos dos homens, sempre com a identidade cinematográfica de Almodóvar. A grande estreia de outubro, inquestionavelmente.
http://www.acampinas.com.br

segunda-feira, 24 de outubro de 2011



Nina
por Rita Marize Farias

Nina quando os abriu, funcionou a olhar
em todos os detalhes, 
as roupas de Antônio postas sobre a cama,
na espera do pós banho.
Na sala,
beijou os cabelos louros do filho cheirando à novidade
Bateu a porta
À porta do mundo
fechou os olhos para as horas passadas
Atravessou o tempo
as ideias
os medos
soltou os cabelos
entregando-os ao vento
Saltou a espera
De olhos bem atentos
Varreu as vitrines da cidade
para além das cores e dos valores
Adiantou o pensamento
Pensou
Parou
Voltou a sonhar
Amassou o pensamento 
e o depositou delicadamente no lixo das ideias
Realizou.
Andando, ainda
A Nina tirou a roupa,
embora se mantivesse vestida.
Atravessou a passagem
Parou
Abriu a bolsa
fitou o papel cor de rosa
enfeitado de carinho
e abriu, além do coração,
pela primeira vez no dia,
o sorriso.
Atravessou mais uma vez, a outra rua
conferiu papel e fachada
marcou o passo no elevador.
Na subida,
Nina ganhou cor
odor
liquidez
insensatez, chegou a pingar, até!
Abriu-se
Estava lá
ao fundo do corredor
no lado esquerdo,
como no peito,
a porta.
Conferiu
papel e porta
abriu-se ela em flor
em sorrisos muitos, desde o primeiro
os dedos a funcionar em cachos novamente
cachos cheirando à novidade
outros
cachos grandes e negros
misturados aos quatro braços
de Nina e Luísa.
Ao fundo,
o reflexo de carinho
no copo de vinho tinto seco.
De espio,
tive que fechar a porta.

Coluna EnCena Poesia
uma visão da cena através da palavra
RITA MARIZE FARIAS
atriz e produtora cultural
Visite: http://interpoetica.com

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Prêmio TOC140. Resultado da 2a. etapa


Prêmio TOC140. Resultado da 2a. etapa

TOC140! Participação recorde. Canadá – Japão – Portugal – Brasil: Alagoas – Bahia – Ceará – Goiás – Minas Gerais – Paraná – Pernambuco – Rio de Janeiro – Rio Grande do Sul – Santa Catarina – São Paulo – Espírito Santo – Tocantins

Prêmio TOC140. Resultado da 2a. etapa
Antônio Campos, curador da Fliporto, a Coordenaçáo e a Comissão Julgadora do segundo TOC140 Poesia no Twitter têm a honra de apresentar o resultado do julgamento da segunda etapa do concurso, ao tempo que parabenizam todos os concorrentes pelos momentos de beleza que agora repartem os amigos da Fliporto 2011 na Grande Teia.  O endereço de votação dos 10 selecionados, para definição do primeiro, segundo e terceiro lugares, será publicado em breve. Faça a sua campanha e sejam todos muito bem-vindos!
PROCEDÊNCIA DAS INSCRIÇÕES DOS SELECIONADOS NA 1ª. E 2ª. ETAPAS
Canadá – Japão – Portugal – Brasil: Alagoas – Bahia – Ceará – Goiás – Minas Gerais – Paraná – Pernambuco – Rio de Janeiro – Rio Grande do Sul – Santa Catarina – São Paulo – Espírito Santo – Tocantins
TOC140 POESIA NO TWITTER
Comissão Julgadora: Antônio Campos, Delasnieve Daspet, Haidée Camelo
Coordenação: Cláudia Cordeiro
Monitoramento: Luanda Calado
2ª. ETAPA
RESULTADO
SELEÇÃO DE INSCRIÇÕES ATÉ 10 DE
OUTUBRO DE 2011 – 
50 PARA A ANTOLOGIA E, DENTRE
ELES, 
5 PARA A VOTAÇÃO ON LINE QUE DEFINIRÁ OS VENCEDORES
OS 5 FINALISTAS DA SEGUNDA ETAPA
@GerusaLeal O outono cintila em prata nos cabelos dela / No sorriso largo e na blusa florida / ainda passeia descuidada a
primavera.#TOC  – Gerusa Barbosa Leal. Olinda, PE
@juauqxz Homologia// Não à toa/ o movimento de abrir janelas,/ abrir asas/ e abrir livros é o mesmo:/ é o movimento da liberdade. #TOC – João Paulo Silva Mammana. Sumaré, SP
@marcos1moura GOYA TRAGOU MEU SONO// Éluard eternizou-se em minhas pálpebras/ Matisse sarou as feridas/ E até hoje vangogueio/ Pelos campos da cana #TOC – Marcos Roberto Moraes de Moura. Recife, PE.
@Sempoesianaoda OLHOS DE LIZ TAYLOR-Tão fácil antes/falar deles:/céus acesos na tela./Difícil é agora/que se apagaram/como safiras engolidas por lobos # TOC – Sérgio Bernardo. Nova Friburgo, RJ
@simonebrichta Ex-impressionismo// No lago do cisne/ a bailarina de Degas/ ouviu o grito de Munch. #TOC – Simone de Fátima Brichta. Fortaleza, CE
SEGUNDA ETAPA
OS CINQUENTA POEMAS SELECIONADOS PARA A ANTOLOGIA

(Inclui os 5 finalistas)
@_fergath O mal do poeta é/ o amor não realizado/ ou achas que eu trocaria/ uma noite de amor tranquila/ por 19 poemas desajustados? #TOC – Fernanda Burgath. Ponta Grossa, PR
@ABRevoredo ELEFANTE// A tromba, que engraçada/ mais parece o outro lado/ é como se fosse uma peça/ que Deus colocou errado. #TOC – Alexandre de Barros Revoredo. Garanhuns, PE
@anapeluso UMA FOLHA // fina assim / de papel, rasgo de azeviche / de cílio / de ontem / de pele, de espelho / aroma, de vento / de toque / você. #TOC – Ana Peluso. São Paulo, SP
@andrefoltran Reconciliação // naquela tarde, / sem nem ter reparado, / ela devolveu a lua / ao céu de onde tinha roubado. #TOC – André Felipe Soares Foltran. São José do Rio Preto, São Paulo
@avdemorais INSPIRAÇÃO//No silêncio da palavra/nasceu minha poesia/Naquele breve instante/entre ouvir e calar./E a mão, atenta/escreveu o verso.#TOC – Amélia Veloso de Morais. Olinda, Pernambuco.
@BetoQuelhas CONVIR// foi com flores que te esperei passar/ esperaria o resto de minha existência/ não fossem as flores/ que estavam em minhas mãos #TOC – Roberto Mendonça Quelhas. São Paulo, SP
@cerquize MUDANÇA// Na menor distância entre a intenção e o gesto/ Entre o extremo e o centro/ O mundo muda por fora/ Se nós mudarmos por dentro #TOC – Felipe Cerquize. Rio de Janeiro, RJ
@CesarDosAnjos7 MENINO NO MATO// eu queria que meus pés / cansados / cantassem as alegrias / de caminhar na terra. #TOC – Sandro Caetano de Sá. Olinda, PE
@crisdakinis AOS DISTRAÍDOS!// Só os incautos ouvem a poesia do dia./ Distraídos que estão,/ do seu diário ganha-pão. #TOC – Ana Cristina Mendes Gomes, São Pedro da Aldeia, RJ
@DanielaGaldino3 PARALELISMO // na retomada do tempo / deram-me um corpo / feito mote / e eu glosei. #TOC– Daniela Galdino Nascimeno. Itabuna, Bahia.
@Dayvsonfabiano SUSTENIDO SILÊNCIO // Docemente reluzi a minha face / solidificando lágrimas / no silêncio / que te doei. #TOC – Dayvson Fabiano Oliveira de Lacerda. Recife, PE
@diosouza Insônia// Quando dormi tinha um grande rebanho/ Acordei e não o tinha mais./ Pastor inteligente é aquele que não dorme! #TOC – Diógenes Souza Freitas. Caruaru, PE
@edusleverve Entre a voz e a poesia, induzido à estesia, o abismo pede a ponte dos teus versos. #TOC – Carlos Eduardo Sales de Souza. Paulista, Pernambuco.
@Edweine IRAQUE// Massacre./ E, numa guerra que engana,/ caixões de madeira/ compõem as fileiras/ da parada Americana. #TOC – Edweine Loureiro da Silva. Saitama, Japão.
@erikapoetisa INFINITOS//No caminho sem caminho/ caminho/se eu chegar em algum infinito de mim/ que seja encontro.#TOC – Érika Renata Alves Santos. Garanhuns, PE
@GarotaNatu MINHA PALAVRA NÃO DIZ NADA, MEU CORAÇÃO FALA, MAS O SILENCIO FICA. #TOC – Cheyenne Fernandes Silva. Jaboatão, PE
@GerusaLeal O outono cintila em prata nos cabelos dela / No sorriso largo e na blusa florida / ainda passeia descuidada a primavera.#TOC – Gerusa Barbosa Leal. Olinda, PE
@Hellyas ÍNTIMO//Os silêncios me calam/para eu ouvir/o que só eu posso gritar/ao longo do caminho/porque silêncio é estrada/e não resposta… #TOC – Elias Araujo. Américo Brasiliense, São Paulo.
@ivaize DEPRE: // Inverno. Meus olhos / na TV mastigam cores./ Tela além, o sol. #TOC – Ivaíze Rodrigues. Belém, PA
@japafour TATUAGEM // Arrancou a pele / com o nome dele / Em vão / O nome já estava marcado / no coração. #TOC – André Telucazu Kondo. Caraguatatuba, SP
@jardsonwtj noite-dia noite-dia noite-dianoite-dia noite-dia noite-dia noite-dia / O corpo cansado no meio/ E a rotina pulsando como um coração #TOC – Jardson Fragoso Carvalho. Itabuna, Bahia.
@joseruypc UTOPIA// Desisto. / Não sei dançar: / essa é a realidade; / mas diante da canção / inaudível / da possibilidade, / bailo dentro de mim. #TOC – José Ruy Pimentel de Castro. Vitória, ES
@juauqxz Homologia// Não à toa/ o movimento de abrir janelas,/ abrir asas/ e abrir livros é o mesmo:/ é o movimento da liberdade. #TOC – João Paulo Silva Mammana. Sumaré, SP
@lanacaram AULA DE MATEMÁTICA// Vejo crianças/ a contar os dedos/ de olhos tristes/ sem contar os sonhos. # TOC – Elana Simone Schiavo. Jaú, São Paulo
@lander1107 IGNORÂNCIA CONSCIENTE// Sou uma alegre mosca / aprisionada num frasco translúcido / consigo ver o mundo / mas não faço parte dele. #TOC – Herlander Mauro Carvalho. Santo Antônio dos Cavaleiros, Portugal.
@Leandroderecife O passaro//Deitado no ninho/Asa desativada/O pensamento voa.#TOC – Severino Leandro da Silva. Recife, PE.
@LoMartoni O EQUILIBRISTA//Controla o meio termo da insanidade/ onde jaz a virtude/ intocável/ sublime/ insustentável/do amor.#TOC – Lorena Martoni de Freitas. Belo Horizonte, MG
@LucasCMendes PUREZA// Se a realidade está no ar / Fico em asfixia / Não tive oportunidade de ser real / Vivo por poesia. #TOC – Lucas Mendes. Araguaína, TO
@manedocafe CASSIANO//Que moeda é aquela/Que tanto brilha/No bolso do mendigo/E o faz tão rei?/É um poema bem sei!#TOC – Jorge Carlos Amaral de Oliveira. Rio de Janeiro, RJ
@marciaslmaia travessura//a lua/na poça da rua/finge-se estrela do mar/#TOC – Márcia de Souza Leão Maia. Recife, PE.
@marcos1moura GOYA TRAGOU MEU SONO// Éluard eternizou-se em minhas pálpebras/ Matisse sarou as feridas/ E até hoje vangogueio/ Pelos campos da cana #TOC – Marcos Roberto Moraes de Moura. Recife, PE.
@MarcosAlvesLope Psicografia viva!// Escrever é psicografar a alma!/ Com leves pinceladas de espiritualidade,/sem perder a tinta do dia-a-dia#TOC – Marcos Alves Lopes. Goiânia, Goiás.
@marcosmc20 CAUTELA // Acabei de descobrir que / o verdadeiro amor não existe. // Vim direto pra cá, prevenir vocês. #TOC – Marcos M. Casadore. Assis, SP
@marlenegil BUSCA//Quanto mais se procura o sentido da vida/ mas nos distanciamos da verdadeira emoção/ Viver é simplesmente não saber a questão. #TOC – Marlene Pereira Gil Filha. Itararé, SP.
@moacirmorran Trova Mundana// O mundo busca a paz/ pisando no sangue inocente/ O mundo quer cheirar a flor/ Mas não quer plantar a semente! #TOC – Moacir Ribeiro da Silva. Fortaleza, CE.
@oeduardosol Disseram: acabou. Mentiram. Dissemos: não havia nada. Negaram. Só não dissemos que entre o espanto e o encanto há a estrada. #TOC – Eduardo Alexandre da Silva Costa. Recife, PE
@paraquenomes Minhas chaves nunca abriram as portas corretas,/ mas não me furto de pular janelas. #TOC – André Salviano. Laranjeiras, RJ
@paulodtoledo entrementes / a serpente / mordaz / desmente / o que / falaz / sibila / entredentes #TOC – Paulo César de Toledo. Santos, SP.
@poesiamovel TRANSE// Indeciso, desci ao inferno / Infiel, enfiei-me pela fenda / E sob a chuva da calenda / Emergi do meu caderno. #TOC – Alex Sandro da Silva. Belo Horizonte, MG
@rogeriogcoelho TEMPO//Enquanto eu comia um pastel, na Rua dos Estudantes,/Meus amigos casaram e tiveram filhos./Pedi pastel de vento, veio de tempo. #TOC – Rogério Gaspari Coelho. Perdizes, SP
@sem_acaso OFÍCIO// Sem métrica nem rimas/ esqueci as redondilhas/ na vida e na poesia. #TOC – Deanna Laíse Ribeiro Cavalcanti e Silva. Olinda, PE
@Sempoesianaoda OLHOS DE LIZ TAYLOR-Tão fácil antes/falar deles:/céus acesos na tela./Difícil é agora/que se apagaram/como safiras engolidas por lobos # TOC – Sérgio Bernardo. Nova Friburgo, RJ
@serod_PE A MENINA E O PÁSSARO// A menina fala que o pássaro vua. /Alguém corrige: – Voa! / Ah, deixa a menina vuar! #TOC – Severino Rodrigues da Silva. Paulista, PE
@simonebrichta Ex-impressionismo// No lago do cisne/ a bailarina de Degas/ ouviu o grito de Munch. #TOC – Simone de Fátima Brichta. Fortaleza, CE
@tallesazigon MURO. Ao invés de óculos escuros / O teu olhar usava um muro/ e ele me anoiteceu #TOC – Jose Talles da Silva Soares. Fortaleza, CE
@tatianadruck REFLEXÃO// Foto é um pedaço de realidade./ Se a vida não pára num clique automático/ por que registrá-la como eterna verdade?TOC – Tatiana Oliveira Druck. Porto Alegre, RS
@thaynadouglas PARTITURA// Ouvindo sons disparatados/ babel acústica em seu redor/ fez de si música própria/ correu, eterna, em sol maior. #TOC – Douglas Thaynã. Curitiba, PR
@thiagojrppoeta RASTROS Sempre ficam rastros retorcidos de palavras/ No silêncio das bocas que valseiam mudas. #TOC – Thiago Rodrigues de Paula. Barbacena, Minas Gerais.
@Truetrickster Dizem que “Escrever é conversar consigo mesmo” Digo, porém,que escrita é desdita excêntrica/ Do que a mente maquina em desordem cênica #TOC – Fábio Henrique Pupo. Ponta Grossa, Paraná.
@vmlanessa MASCARA (DA)// Não era bonita/ Mas seus olhos escutavam/ Descobriram-na vazia/ E, com o tempo, se afastavam… #TOC – Vanessa Maria de Lima Albuquerque. São Paulo, SP

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Li no JC de hoje sobre a poesia de Szymborska e fiquei fascinada. Passei a pesquisar e achei o texto abaixo no site da Livraria Loyola. Em seguida, um outro poema, lindíssimo.


As relações entre a palavra e a experiência histórica podem ser de natureza muito diferente e não existe essa coisa simples que é uma geração de poetas que começou durante a guerra mas não sobreviveu. Que relação pode haver entre a poesia de Szymborska, caracterizada precisamente pela sua ligeireza céptica, sorridente, lúdica e a história do século XX, ou de qualquer outro século? De início sim, teve muito que ver, mas na sua fase de maturidade ela foi-se afastando das imagens desse tempo linear que se precipitava para a utopia ou para uma catástrofe apocalíptica - em que este século, que agora termina, quis acreditar. A dimensão da sua poesia é pessoal, a de alguém que reflecte sobre a condição humana. É certo que tal actividade é acompanhada por uma extraordinária reticência; como se a poetisa se encontrasse de repente num palco decorado para uma velha peça de teatro, uma obra que transforma o indivíduo em nada, num número anónimo e como se, nestas circunstâncias, falar de si não fosse o mais indicado. Os poemas de Szymborska exploram situações pessoais, mas são ao mesmo tempo tão genéricos que permitem à sua autora evitar as confidências. No seu conhecido poema sobre um gato num apartamento vazio, em vez do lamento pela perda do marido de uma amiga, lemos: Morrer / isso não se faz ao gato. A reticência e a distância irónica consigo mesmo são, sem dúvida, reveladoras das tendências mais marcadas da poetisa.(.) Para mim, Szymborska é, antes de mais, uma poetisa da consciência. Isso significa que nos fala, aos seus contemporâneos, como se fosse um de nós, reservando e guardando para si assuntos pessoais e intervindo de certa distância, mas sem deixar de remeter para o que cada um sabe da sua própria vida.» Sobre Szymborska, (Nobel da Literatura de 1996), por Czeslaw Milosz


Gato em apartamento vazio

Morrer – isso não se faz com o gato.
O que pode fazer um gato
em um apartamento vazio?
Subir pelas paredes?
Esfregar-se contra
os móveis?
Nada parece diferente aqui,
mas já não é mais a mesma coisa.
Nada foi movido,
mas não há mais espaço.
E à noite ninguém mais acende a luz.

Ouvem-se passos na escada,
mas eles são novos.
A mão que coloca o peixe no pratinho
mudou também,

Algo aqui não acontece
na sua hora habitual.
Algo não acontece
como deveria.
Alguém estava sempre, sempre aqui,
então, de repente desapareceu
e teimosamente permanece desaparecido.

Cada armário foi examinado.
Cada prateleira tem sido explorada.
As escavações embaixo do tapete não deram em nada.
A ordem foi mesmo quebrada.
Contra todas as proibições até,
há papéis espalhados por todos os lados.
O que resta a ser feito.
Apenas dormir e esperar.

Basta esperar até que ele apareça,
apenas deixá-lo mostrar o seu rosto.
Ele vai aprender
que com um gato não se brinca assim.
Vou em direção a ele
como quem não quer nada,
bem devagar,
sobre as patinhas visivelmente ofendidas,
e, a princípio, sem saltar ou miar.

Wislawa Szymborska
Os filhos da época

WISLAWA SZYMBORSKA
Tradução: Ana Cristina Cesar

Somos os filhos da época,
e a época é política.
Todas as coisas - minhas, tuas, nossas,
coisas de cada dia, de cada noite
são coisas políticas.
Queiras ou não queiras,
teus genes têm um passado político,
tua pele, um matiz político,
teus olhos, um brilho político.
O que dizes tem ressonância,
o que calas tem peso
de uma forma ou outra - político.
Mesmo caminhando contra o vento
dos passos políticos
sobre solo político.
Poemas apolíticos também são políticos,
e lá em cima a lua já não dá luar.
Ser ou não ser: eis a questão.
Oh, querida que questão mal parida.
A questão política.
Não precisas nem ser gente
para teres importância política.
Basta ser petróleo, ração,
qualquer derivado, ou até

uma mesa de conferência cuja forma
vem sendo discutida meses a fio.
Enquanto isso, os homens se matam,
os animais são massacrados,
as casas queimadas,
os campos se tornam agrestes
como nas épocas passadas
e menos políticas.




Wisława Szymborska (Kórnik2 de Julho de 1923) é uma escritora polonesa.
Destacou-se como poetisa com uma obra que tem como tema as vicissitudes da Polônia moderna. Emprega uma linguagem simples e coloquial, herança do realismo social que dominou a Europa oriental, mas sua modernidade se revela no tom irônico e na complexidade formal de muitas de suas poesias.
Recebeu o Nobel de Literatura de 1996.

sábado, 8 de outubro de 2011

O poeta, escritor e jornalista Francisco Austerliano Bandeira de Mello, 75 anos, morreu na madrugada desta sexta-feira (7), no Recife, vítima de um ataque cardíaco. Não o conhecia, porém, presto-lhe uma homenagem:





O HOMEM DE PEDRA

Hoje deu-me náuseas
a arte: força é cantar
os ritmos do escuro
as rosas sepulcrais
o nosso barro imóvel?

O mundo: caos e ordem.
E os nossos olhos flamam
de sonhos, no sal longínquo
dos lagos da espera.

Apagam-se as rosas
belas e verdes, na noite.
Ficamos sós embebidos
de esperanças e cinzas.

Quem estamos nós
quando estamos sozinhos?
que sol corrói nossa alma
perfumada e escura?

Prisioneiros, um dia
vestimos nossa mão de luta
de roxas desilusões
e pálidos abismos.

Prisioneiros, um dia
vestimos nossa mão
de luta, comícios de pedra.

          (A máquina de Orpheu)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

OFICINA DE CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS

Participei, nos dias 06 e 07/10 da OFICINA DE MEDIAÇÃO DE LEITURA E CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS – DA PALAVRA QUE SAI DA BOCA À PALAVRA ESCRITA: por que, para quem, onde e quando ler ou contar histórias, com a facilitadora Érica Verçosa. Foi uma ação da Hora do Conto, realizada na Fundação Joaquim Nabuco, através de Gicélia, bibliotecária da instituição.
No último dia, foi nos dado um mote para criar uma história. A minha foi sobre um relojoeiro “a moda antiga” que adora misturar as engrenagens redondas de seus relógios e inventar desenhos para seus mostradores. Vejam como ficou:

Há muito tempo atrás, quando ainda não existia pressa, quando o despertador era o canto do galo, quando o sol marcava a passagem do tempo, havia um relojoeiro que inventava desenhos para os mostradores.
Quando amanhecia, ele esticava o corpo no alto, até alcançar as últimas gotas de orvalho. Às nove horas, quando o sol escaldante zunia pelo caminho, o homem retorcia o corpo se protegendo do calor. Ao meio dia, quando as forças diminuíam, aspirava néctar, fluidos e fertilidade. A tarde caminhava para o final, o tempo esfriava e soprava um vento leve.
O homem sabia que o tempo não tropeça, não para, o tempo urge e foge pelas mãos. Ele sabia e um brilho iluminava todo seu ser.
Lá em cima, a lua anunciava a noite, trazendo consigo mistérios, poder e o aquecimento das estrelas.
Todo dia era o fim do mundo. Todo dia era um novo começo, até o dia em que o céu cair e as estrelas pararem de brilhar.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Saiu o resultado do I Concurso de Poesia do Instituto Cervantes Recife, que teve como tema o livro : Aline de Fátima Soares e Silva. Vejam abaixo:



Tema: Libro
Titulo: El ficcional en mi real

Entretenidas son estas fantasiosas historias
Ocultan amores, miedos, dragones, secretos,
Deseos y sueños que me parecen concretos.
Vidas, romances, momentos llenos de glorias.

Me pierdo en estas hojas pintadas con letras.
Deseo ser como Sherlock Holmes, volar con Peter Pan,
Ir de paseo junto al Quijote, recibir un rojo tulipán.
Las palabras atrapan, en el enredo te encalletras.

Hermoso romance que ya me hizo llorar
Hazme personaje fantasma de tu propia trama.
Permítame conocer y probar el sabor del amar.

Interpretar en las líneas y letras tu criptograma.
Crear lo que antes solamente he podido soñar.
Y al cerrarte, ante a mis ojos, la realidad se entrama.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

PESSOAS SÃO CONTINENTES

No ventre da sala
Recebo um breve afago do vento
Levanto da poltrona
E tento visitar o mundo lá fora
Mas não vou
É que a vontade de estar só agora
É meu norte
É meu senhor
É minha senhora


Alexandre de Sá (1996)