domingo, 14 de novembro de 2010

HOLOFOTE - CIA DE IDEIAS

Rafael Jacinto, Pio Figueiroa, João Kehl e Carol Lopes



Por Daniela de Lacerda

Entrevistávamos as mesmas pessoas, ouvíamos as mesmas histórias, íamos aos mesmos lugares. Mas quando o fotógrafo Pio Figueiroa revelava o filme, víamos tudo diferente. Porque ele percebia aquelas pessoas, histórias e lugares de um jeito tão próprio, e tão bonito, que sempre nos surpreendia. E encantava. Era assim quando trabalhávamos juntos, no tempo em que ele ainda morava no Recife, lá pelos anos 1990. Tempos depois, na São Paulo pós-revolução digital, o pernambucano encontrou João Kehl e Rafael Jacinto, dois fotógrafos paulistas tão peculiares quanto ele. E aí surgiu a Cia de Foto, um coletivo não só no nome, mas na forma de pensar, fazer, pesquisar e viver a fotografia. A essa turma se juntaram Flávia Padrão (coordenadora de produção), Deborah Lindau (coordenadora administrativa) e a dupla da pós-produção, Carol Lopes (fotógrafa e aprendiz de colorista) e Kosuke (fotógrafo e aprendiz da aprendiz de colorista). Desde então, cada novo ensaio, campanha ou filme da Cia de Foto é uma surpresa só. Como naqueles instantes em que íamos desenrolando os negativos contra a luz, ansiosos por descobrir o que Pio trazia da rua. Uma das mais recentes mostras do coletivo, Entretanto, que foi exibida neste mês na Galeria Vermelho, em São Paulo, é foto, é vídeo e é música. Intrincadamente.

A partir de uma imagem do ensaio Carnaval, realizado em Salvador (BA), o DJ Guab, parceiro da Cia, criou Paisagem sonora, peça musical de 25 minutos. Ele extraiu o código binário da foto (veja acima), isolou os bits que identificam o exato momento do clique e construiu um arquivo sonoro baseado naquela mesma sequência de números. “Geramos uma foto de som, um som de foto”, diz Guab (escute: www.ciadefoto.com.br/blog).


Foto do ensaio Carnaval, realizado na Bahia


Em outro trabalho, Longa exposição, foto e filme enveredam um pelo outro. Na série de retratos, personagens como as cantoras Elza Soares e Pitty e o diretor Hector Babenco esperaram o clique, “que só veio no momento em que a situação ficou insustentável”. O que foi exposto foi exatamente o antes, a inquieta espera, registrada pela câmera em modo vídeo.

Esse experimentar inusitado é essência, também, da participação da Cia de Foto em Histórias de Mapas, Piratas e Tesouros, em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo. O coletivo é um dos curadores e convidou o cineasta Marcelo Pedroso (PE), o fotógrafo João Castilho (MG) e a Galeria Experiência (SP) para uma ação-performance, uma pirataria multimídia sem limites para a invenção. Alguns artistas da exposição, que poderiam ter obras reinterpretadas pelo grupo, se recusaram a assinar o termo de autorização. “A gente nem tinha consciência do que fazer ainda e já estávamos gerando consequências”, lembra Pio. Talvez eles surpreendam todo mundo novamente e não se apropriem de imagem nenhuma. E, sim, do bendito termo.


Cia de ideias
A Cia de Foto foi criada em 2003, atua no mercado editorial e publicitário, integra o time da produtora de vídeo Paranoid BR, participa de mostras e workshops mundo afora, tem trabalhos publicados e exibidos em dezenas de países, faz foto, filme, música, livro, curadoria. Saiba mais aqui: www.ciadefoto.com.br.

Co-le-ti-vo. Entendeu?
O grupo não assina nada individualmente. Tudo é Cia de Foto. “É uma caixa de sapato coletiva”, explica Pio Figueiroa, usando como referência o título de um dos trabalhos deles (assista ao vídeo Caixa de sapato no site de Aurora: www.diariodepernambuco.com.br/aurora). Tem gente que implica. Em 2006, a Cia de Foto foi convidada para participar da Coleção Pirelli/Masp de fotografia, mas acabou não entrando porque fez questão de assinar como Cia de Foto (e não como João, Rafael ou Pio). O coletivo está na coleção 2010. Como Cia de Foto.

A academia visita a empresa. E vice-versa
Na Cia de Foto, o trabalho comercial e o de pesquisa interagem o tempo todo. Seja num filme publicitário ou num ensaio documental, o que eles querem é contar histórias. De um jeito que só eles sabem contar.


Professor Rubens

O vídeo é resultado de uma parceria entre a Cia de Foto e o professor Rubens Fernandes Junior, um dos principais pensadores da fotografia no Brasil, diretor da Faculdade de Comunicação e Marketing da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), em São Paulo. O trabalho foi realizado a convite do Festival Internacional de Fotografia de Porto Alegre (FestFotoPoa) e será exibido na próxima edição do evento, em abril. Colecionador de fotografias dos outros, o professor Rubens faz uma sensível reflexão a partir de uma caixa de fotos de uma família japonesa, comprada numa de suas andanças pelas feiras de antiguidade.


Sal e prata

Produzido em Boa Viagem, no Recife, faz parte da ação-performance coordenada pela Cia de Foto na exposição Histórias de Mapas, Piratas e Tesouros, em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo, até 19 de dezembro. A ação, com curadoria da Cia, também tem a participação do cineasta pernambucano Marcelo Pedroso, do coletivo paulista Galeria Experiência e do fotógrafo mineiro João Castilho. O grupo de “piratas” se apropriou do título de uma obra do artista ém participa da exposição no Itaú.

(www.diariodepernambuco.com.br/aurora de 14/11/2010)

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